Esta era a frase entoada por milhares de pessoas ao mais ilustre desportista português do século XX, aquando das suas cerimónias fúnebres.
Além daquela expressão, aliavam-se as televisões, rádios e demais meios de comunicação social abrindo os seus noticiários, curiosamente em dia de Reis (6-1-2014), com frases tais como: «A última viagem do “rei”»; «As pessoas prestam a sua homenagem ao “rei”»; etc. Ou seja, foi rotineiro e abundante, mesmo na voz de jornalistas conhecidos, como por exemplo José Alberto Carvalho da TVi, falar-se do “rei” para lá, do “rei” para cá. Sinceramente…até não achei mal.
Ademais, outras das palavras que se ouviram generalizadamente naqueles dois dias (5 e 6 de Janeiro) foram: consenso, união, grandeza, humildade e outras contextualmente similares… i.e. palavras que definem (ou devem definir), de facto, um Rei. Aquilo a que nós, portugueses, já não estamos habituados (ou sequer já conhecemos…), nem formalmente possuímos desde 5-10-1910.
Durante dois dias, curiosamente, criava-se a ilusão, à nossa volta, que tínhamos um Rei e que viveríamos numa (espécie de) Monarquia. O Povo clamava pelo “rei”, bem como entristecia-se, unificado, pela sua perda e aí estaria o novo regime de dois dias. Um povo, o meu, que se apresentou conciliado e unido em torno de um jogador de futebol… de um “rei”. Tal como um Rei, humano, Eusébio, gerava consenso entre partes opostas. Humano (e não tratando-se duma “divindade” com dizia Ricardo Araújo Pereira [e demais dizeres bacocos similares também ditos por outras “personalidades”]), Eusébio, na consciência colectiva, acaba por gerar aquela manta bastante cozida de um enormíssimo conjunto que o respeitava, admirava e sabia da sua importância para Portugal, bem como da sua entrega a este País. Todos sabem que o “rei”, à frente de qualquer interesse pessoal, punha sempre os interesses do colectivo.
Como sportinguista, e apesar de ter manifestado o meu profundo desacordo correlação a uma entrevista que Eusébio deu, em 2011, à revista Única (antiga edição do Expresso), contudo, é me fácil transpor alguma mágoa clubista e reconhecer no benfiquista o seu melhor. E porquê? Porque as suas qualidades e demonstrações ao longo da vida são enormemente superiores a qualquer entrevista ou parcela de vida. Isso também sucede porque interpreto a vida de Eusébio como sendo sempre mais de Portugal do que de um clube…por maior que ele seja. Diria mesmo, como sportinguista, que lhe reconheço o estatuto popular/futebolístico de “king”.
Mas importa ressalvar, talvez como o mais importante, no contexto do triste falecimento precoce de Eusébio que, apesar da melancolia que muitos submergiram, aquando da notícia, cravados num sentimento de perda de uma parte daquilo que era o melhor em nós, por outro lado, emergiu uma esperança, uma estreita esperança num povo que, afinal, pode estar todo unido e dar as mãos e isso é, enormemente, bom.
Eusébio, o jogador da bola (para usar uma expressão vilã), era de facto alguém maior em Portugal e no mundo. Estando nos meus late thirties, fiquei estupefacto com as repercussões mediáticas da sua morte no mundo e como os mais prestigiados meios de comunicação social cobriram com interesse o assunto, quando Portugal é um País que, supostamente, para alguns, não tem interesse. Errado! Mais uma vez se constata que, onde a política e a república não estão envolvidas, Portugal volta a crescer. A muitos custa-lhes que um jogador da bola seja, probatória e objectivamente, maior do que eles, revelando-se aqueles, simultaneamente, e com tais posições, quem são. Uns que não conseguem tolerar que, no País, exista alguém com estatuto popular bastante maior. Outros, de tão habituados que estão a dimensões diminutas, nem sabem como agir perante um fenómeno “imperial” desta envergadura com é o caso de Eusébio. Para que fique claro, estes senhores não gostam de “reis”, não o são, não querem, nem nunca haverão de ser “reis” em Portugal…mas é o povo português que lhes dita ou ditará isso. Esses são os senhores que representam a república…os “reis”, o Reino, são outra realidade: o nosso Portugal!
Por isso para mim é clarividente, Panteão o quanto antes para o campeão Eusébio. Era herói, pois deu enormes alegrias aos portugueses sem ter pedido em troca. Merece, tal como Amália. O dia, a quente e não racionalizado, de 6 de Janeiro de 2014, fala por si. Nunca, em vida, havia visto algo similar àquilo. Não há dinheiro ou logística que devam impedir a trasladação. Se houver falta de espaço no Panteão, tire-se Aquilino Ribeiro, que não merece lá estar, e solve-se a questão. Talvez, quiçá, a logística fique mais em conta.
Em ambiência final, de ressalvar que no estádio da Luz, no dia da morte do supercraque, populares colocaram uma coroa na cabeça da estátua de Eusébio. O povo, à sua maneira, sabe como honrar os seus mais estimados e nobres. Há algo inexplicavelmente nos portugueses que clama por um Rei. Já não é só o vaticínio de Alexandre Herculano, diria mesmo que tal fenómeno é intrínseco ao povo português. Ouvia-se nas ruas de Lisboa: «Eusébio, és o nosso “rei”!»
Na segunda-feira, no dia do seu funeral, foi o povo que disse que aquele homem era o seu "rei", não um homem importante, não um ministro, não um presidente, não um chairman, eles identificaram-no com o melhor que sabiam, com a pureza habitual de um povo: “rei”!
O Eusébio, para ser “rei” não o foi apenas por ser um dos melhores jogadores de futebol que o planeta conheceu. Era preciso mais do que isso. Para todo um País e para uma parte do mundo, o Eusébio era algo mais...um conjunto que todos sabem: homem nobre de sentimentos, homem humilde, homem afável, homem cativante, homem respeitador, homem trabalhador e outros tantos pergaminhos raros hoje num ser humano.
Quando um Rei morre, todos, mas todos mesmo, entristecem-se e prestam-lhe respeito em união. Foi o que aconteceu com o nosso “rei” Eusébio da Silva Ferreira.
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